Na tradição monástica a relação inspirada pela fé e orante com a Escritura, enquanto palavra viva de Deus é o lugar
privilegiado do encontro pessoal com Jesus, Palavra encarnada do Pai. Por isso a Lectio Divina, assim como a liturgia, nas
suas diversas expressões, tem um destaque especial no caminho espiritual do monge e na mesma estrutura do horário do dia
da comunidade. "Conhece o coração de Deus nas palavras de Deus", afirma o grande Padre da Igreja São Gregório Magno.
E São Romualdo entrega aos discípulos esta pequena "Regra de Ouro”: “Fica sentado na tua cela como no paraíso... Fica
vigilante e atento aos bons pensamentos como um bom pescador aos peixes. Única via, para ti, encontra-se nos Salmos.
Não deixá-la nunca". Na realidade através da meditação atenta, cuidadosa, e cheia de amor da escritura, o monge
procura cultivar a relação pessoal de fé com o Senhor, Palavra vivente do Pai, acolhida graças à solicitação do Espírito Santo.
Abrindo-se à sua inspiração e deixando-se guiar pelo seu impulso interior, ele se torna o ventre materno no qual a Palavra
continua encarnando-se, como aconteceu na Virgem Maria, modelo perfeito do discípulo e figura da igreja. Maria é o
símbolo daquela abertura total a Deus e aos outros, à qual é chamado todo discípulo de Jesus e que constitui a meta do seu
seguimento. O próprio Jesus afirma que quem escuta e cumpre a palavra do Pai, se torna para ele irmão, irmã e mãe(cf Lc 8,
21). Entramos junto com ele no dinamismo da Palavra do Pai e do seu amor que se faz história da nossa salvação, enquanto
ela “hoje" nos converte e renova. É esta mesma história que celebramos na liturgia, meditamos na escritura, procuramos
realizar no processo da nossa conformação a Cristo.
As Constituições camaldolenses indicam a celebração da Eucaristia e da Liturgia das Horas, a Lectio Divina e a oração
pessoal silenciosa, como um conjunto de passos indivisíveis que trilham o único caminho do encontro vivificante com a
palavra viva do Senhor. Caminho que insere o monge nesta maravilhosa história de amor, e molda sua vida espiritual, suas
relações dentro da comunidade e sua presença testemunhal na igreja. Ao centro ideal do dia da comunidade monástica
está a celebração da páscoa do Senhor na Eucaristia. A Lectio Divina pessoal prepara sua celebração despertando a
atenção interior do monge, a conversão do seu coração.
A Liturgia das Horas, com sua modalidade própria de celebrar o mesmo mistério pascal, constitui como a dilatação no
tempo deste respiro pascal, enquanto a oração silenciosa deixa o monge mergulhar nas suas águas vivas. A periódica
partilha comunitária da Lectio Divina pessoal (Collatio) contribui a criar entre os membros da comunidade o sentido de
pertencer ao mesmo caminho de graça e de misericórdia de Deus. O exercício prático da Lectio Divina pressupõe uma
abordagem animada pela fé e orante ao texto sagrado, a intimidade com Cristo, e a fidelidade no compromisso cotidiano,
além e mais do que o estudo puramente intelectual da escritura.
A mesma atitude que sustenta a autentica participação ativa, interior e ritual, ao mistério do Senhor celebrado na liturgia.
Segundo o método consolidado dos antigos mestres do espírito, o caminho concreto da lectio divina, compreende quatro
etapas.
Elas indicam mais atitudes interiores a cultivar do que degraus a ser percorridos sucessivamente um depois do outro em
sentido estreito.